Para o maior amor do mundo
Rio de Janeiro, 03 de agosto de 2018
Eu
sei que você não gosta de exposição, mas não pude evitar. Sei também que você
não ia me querer no Rio chorando pela sua ausência. Então já aviso que ainda
não chorei, mas é possível que escrevendo para ti eu me emocione tanto quanto
hoje, te vendo naquela figura ao meu lado. Mãe, esse texto é para você.
É,
mãe, eu cresci. Estava lá, fazendo amizade com estranhos no trem, uma cena tão
típica de São Paulo e me peguei dando conselhos de como criar filhos a partir
de como você me criou. Mas, calma, vou contar do começo. Comprei duas empadas
no trem (aqui o Shopping Trem é um serviço muito mais amplo aqui, você tem que
conhecer). A mulher ao meu lado pegou uma. Começamos a falar disso que eu gosto
tanto que é comida. Aliás, tô com saudade de dividir uma refeição contigo.
A
conversa aqui no trem seguiu e ela me contou dos filhos. Ela tava voltando de
um dia longo de trabalho, ia ver a mais nova. A bebê tem um ano e quatro meses
e recebe a mãe na porta, balançando os bracinhos. Acho que me imaginei nessa
hora engatinhando até você, que mesmo com todos os desafios ficou toda a
infância ao meu lado. Ela não teve essa chance, é a irmã mais velha, de 15, que
cuida da menor enquanto a mãe carioca trabalha. Nessa casa falta um. O filho de
17 saiu para morar com uns amigos e ganhar uma grana fácil. E ele não faz ideia
de como tá deixando a vida da mãe dele difícil. A preocupação se mistura com a
fé aqui: preocupação do plano material, do conhecimento de que o mundo é
perigoso e as pessoas ainda mais. E fé, no amor de Deus e no amor dela mesma,
de que em alguma medida esses dois sentimentos podem ser maiores que os perigos
que cercam e que moram no filho.
Eu,
na minha ignorância, questionei se a dor era amenizada com uma criança pequena
em casa, apostei na luz que elas trazem consigo. E ela, em toda grandeza da
simplicidade de quem sente de verdade, me respondeu que na relação com os
filhos cada um tem seu espaço: “mesmo se eu tivesse 20, sofreria a dor de cada
um. Nessa hora eu quis chorar, por toda a dor que ela deve estar sentindo e por
toda a dor que eu já devo ter te causado. Me desculpa, mãe, por cada vez que te
fiz sofrer. Eu não tenho dimensão do que é se preocupar com alguém enquanto
você almoça se perguntando se a outra pessoa comeu. Não faço ideia de como é
estar num dia frio se preocupando com a possibilidade de o outro não estar
agasalhado. O amor materno mostra um altruísmo incrível. E eu tenho muita sorte
de ter uma mãe tão incrível como você.
E
mesmo as dores não afastam vocês da felicidade. Nem a sua nem a das suas crias.
Essa mãe carioca que rala todo dia acordando às 4h da manhã e cruzando a
periferia do Rio para sustentar a casa sozinha tá animadíssima com o sonho da
filha de entrar para a Marinha. E eu tô botando fé nessa possibilidade. Eu sei
que a filha ainda está no EJA e as chances não são boas. As chances não são
boas para os pobres. Talvez não fossem para gente também. Mas olha onde estou,
onde quero chegar e te levar. Então acho que é isso, é realmente uma vida sem
garantias. Mas, se tem uma mãe apoiando, as chances abrem passagem.
Mãe,
aqui na periferia a vida é muito dura. Mas a fé é muito forte. Essa força que
só quem enfrenta uma selva por dia constrói. Eu acredito mais na força humana
agora. Foi uma experiência muito diferente passar uns dias fora da capital. E
conhecer o morro. Aconteceu bastante coisa para uma semana de viagem. Tem muito
mais por vir. Te conto quando voltar, você vai ver como é rápido. Enquanto
isso, vou te ver em cada gesto de amor materno por aqui. E em cada comida que
eu aprender a cozinhar. Vou aprender bastante para desenvolver esse país. E me
desenvolver. E não esquece de aprender francês, ainda vou te levar em Paris.
Te
amo. E obrigada por nunca desistir, nem me deixar desistir de mim. Seu apoio
nos meus sonhos é o maior presente que eu podia pedir. Quem sabe um dia consigo
retribuir, pelo menos um pouquinho, o bem que vocês cultivam nesse planeta. Até mais, mamãe!
Rebeca
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