Feliz dia do meu melhor amigo

São Paulo, 11 de agosto de 2019

Dia dos Pais

Ele é o homem mais romântico que eu conheço. Não só nas suas relações amorosas. Na forma como faz as pessoas se senritrem ouvidas e entendidas. Nas flores que presenteia. Nas brincadeiras de rua com as crianças. Na ajuda a quem mais precisa no bairro. Se isso for hereditário, faz todo sentido eu ser mais uma romântica incorrigível dos Almeida.

Mas essa história não começa aqui. Cachoeirinha, Pernambuco. Origens de um povo sofrido. Cada nordestino que migrou para o sudeste conhece o preconceito na pele. E no bolso. Com a minha ele não foi diferente.

Filho mais novo de uma família de sete irmãos, papai andava 14 km para chegar a escola desde os 5 anos de idade. Migrou para São Paulo aos 18 e nunca voltou para casa. Poupava a grana no ônibus para ter o que comer, o que significava caminhar por 3 horas depois de um longo dia de trabalho. Sempre manteve a justiça e a generosidade como guias de conduta, e mesmo sem ir à igreja (ou talvez por isso mesmo) tem uma fé inabalável.

Não estudou tanto quanto gostaria, mas sempre me ensinou como o conhecimento transforma nossa vida. Nunca falou outro idioma, mas me fez entender o poder da comunicação desde pequena, simplesmente porque conversava comigo de forma sincera e madura. Me deu confiança, nele e na vida. E trabalha diariamente para aumentar minha confiança em mim. E eu não seria metade do ser humano que sou sem ele.

O sangue vermelho e ideológico que compartilhamos carrega mais do que nosso DNA comum. Ele transmite o sonho de vermos um Brasil mais igualitário e harmônico. Mantem viva a vontade de elevar a educação como propulsora das principais transformações individuais e coletivas. Alimenta o brilho no olhar de quem segue se apaixonando todos os dias, pela vida e pelos encontros do caminho.

Aliás, com quase 60 anos, ele se apaixonou numa nova volta do caminho. Durante nossa 1h30 de conversa ao telefone no sábado à noite, pelo menos 1 hora foi dedicada ao amor. Ele ouviu minhas histórias e especialmente minhas dúvidas sobre “aquel encantamiento que tengo yo”. E eu o ouvi sobre a sua "deusinha". No final de contas, estou ansiosa para ser sua madrinha de casamento - já é um casal que eu apoio.

Passamos por altos e baixos nessa relação de pai e filha. Já tivemos discussões que deixaram marcas. Já tivemos fases em que não parecia que criaríamos esse vínculo. Mas, acho que se olharmos bem, sempre foi obvio que Gêmeos e Escorpião iam se entender. Eu começo o assunto do dia e ele sabe puxar as questões que aprofundam o tema. Eu aprendi a respeitar o seu silencio, e ele aprendeu a confiar em mim para não ter medo de falar. Eu mostrei as perspectivas de uma mulher do século XXI e ele, disposto a mudar, analisou como foram construídas as bases do pensamento do nordestino dos anos 1960.

Hoje, meu pai é meu melhor amigo. E isso é um presente incomparável da vida para mim. Por isso hoje eu me sinto presenteada. A felicidade em ver na mesma casa minha irmã mais velha, que só conheci nos meus 21 anos junto com quem eu torço para entrar para família como uma espécie de “madrasta” e, especialmente, ver a a alegria do meu pai nisso tudo me lembra de como há lutas que valem a pena. A luta para ser melhor, para perdoar a si e aos outros. A luta pela família, que para além de laços sanguíneos são os laços que escolhemos fortalecer. Por isso não tem como evitar ser romântica. É um presente imenso ter esse laço tão bonito na minha vida.

E pra você que leu até aqui, espero que independente de com quem você construa vínculos, possa ter seus laços também. Possa ter um alguém com quem pode ser 100% você. Possa se sentir livre nas conversas com quem está ao seu lado. E possa agir e confiar que o outro age na base do amor e confiança. Aprendi em casa que as relações devem funcionar assim. Todas elas. Se sua relação com sua família, essa que tem em casa ou na extensão do termo, ainda não é assim, se esforce. Dá tempo. Maninha passou 26 anos até esse dia e cá estamos. Te prometo: fazer o teu melhor pelo que te importa vale a pena. E obrigada, papai, por me ensinar isso todos os dias.