Para os universitários
São Paulo, 02 de agosto
de 2019
É incrível
como a humanidade pode ser melhor quando se vê como grupo. E não o grupo que se
coloca como superior aos demais. Mas como grupo disposto a ajudar quem está ao
seu redor.
Talvez
essa não seja a experiência de faculdade mais usual. Sei que há disputas,
intrigas, divergências – como em qualquer grupo de pessoas. Mas dentro desse
universo particular que é a minha experiência como universitária, vejo um
potencial gigantesco nessa comunidade.
A
cena da qual nasce esse texto é das mais triviais. Uma carona num guarda-chuva
num dia frio de São Berlondres Bernardo. Uma cena que já acontecera
comigo antes, inclusive em outros espaços universitários. Mas nessa época de
ataques à esse espaço em que buscamos, ainda com tantos erros e desafios, gerar
mais igualdade num país desacreditado interna e externamente; num período em
que a produção de conhecimento e questionamentos são chamados de “balbúrdia”,
senti com ainda mais força como a empatia e a união são também nossas formas de
resistência diárias. Esse texto nasce depois de uma virada de tempo bizarra
(mas não incomum por aqui, em termos climáticos e políticos), no final da
primeira aula.
Temos
um grupo dos moradores do condomínio perto da faculdade. Montado por alunos
para alunos. Ali a gente compartilha caronas – em carros, guarda-chuvas ou nos
passos lado-a-lado – seja nos trajetos para faculdade, trabalho ou de volta para
casa. Também surgiram grupos para os alunos se encontrarem nos metros e
dividirem corridas de Uber até a aula. Eles se tornaram imprescindíveis para
manter o acesso à faculdade viável, especialmente depois dos cortes de verbas
que sofremos. E essa nossa capacidade de resistir ao caos imposto com uma organização
colaborativa me encanta.
Pois
bem, por esse grupo de alunos-moradores eu contatei o herói da noite. Saí sem
blusa com capuz, sem guarda-chuva e sem óculos para a única aula da noite.
Estava montado o cenário perfeito para a jornada de regresso à casa. Mas, para
minha sorte, ele estava esperando, mesmo sua aula tendo terminado cedo, para
caso alguém precisasse de abrigo da chuva. Já imagina como eu estava plena como
a pessoa da gratidão.
Mas universitários
são caixinhas de surpresas. O coração enorme não nos move só nas brigas políticas
e na divisão das contas nos bares. A intensidade que aplicamos a todos os
diálogos transforma o nosso jeito de ser e ver o mundo (que no final de contas
são temas dialéticos, mas isso fica para outro texto). Assim, minha conversa
durante nosso curto trajeto para casa não poderia ser diferente. Dividindo
guarda-chuva com um estranho descobri sobre a origem bíblica de seu nome, as
piadas da família e um pouco de das histórias da sua origem. É claro que esses
espaços curtos de conversa não abrangem o infinito que é outro ser humano. Mas
aquela luzinha já me iluminou mais um pouquinho.
Essa
claramente é uma experiência que não aconteceria só no mundo universitário. Ao contrário,
as Histórias da Cidade são mais cheias de coisas boas do que podemos ver. Mas aqui, nesse espaço hoje ameaçado, existem grupos extraordinários de pessoas
reunidas buscando soluções para humanizar nosso mundo. E dessa forma simples quero tentar homenageá-las. Para quando estiverem a ponto de perder a fé nessa possibilidade transformadora, enxerguem umas às outras nas
batalhas diárias e achem força para, numa chuvosa sexta-feira à noite, sorrir e
acompanhar alguém até em casa, trocando a confiança e companhia, se
lembrando de que nada está perdido. Afinal, das milhões de coisas que eu
aprendi na faculdade, entendi que “sigue habiendo alternativa porque sigue
habiendo lucha.”
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