Ainda é uma flor


São Paulo, 25 de setembro de 2019

Ela está mais sequinha. E enrugada. Desabrochou e perdeu um pouco da maciez nas pétalas, de quando ainda era um botão. Já mudou um pouquinho de cor por fora, o tempo e o frio tiveram um efeito nos seus contornos.

Mas segue sendo uma flor. Sua cor ainda é vibrante. Nas pétalas mais protegidas do mundo exterior, segue macia e com seu perfume. Resistiu bravamente por mais tempo que a maioria. Acho que por isso mesmo vejo mais beleza nela hoje do que no dia que chegou. Afinal, Saint-Exupéry tem razão: é o tempo que dedicamos às nossas rosas que as tornam tão importantes.

Dedicar tempo ao que sabemos ser efêmero é mesmo uma prova de amor. E vemos isso em vários tipos de amores. O amor que os pais dedicam aos filhos, sabendo que é uma reciprocidade limitada pelo menos nos anos iniciais, criando-os para que descubram o mundo e, um dia, não estejam mais na mesma casa. O amor que dedicamos aos pets, abraçando, de forma consciente ou não, uma vida que veremos partir. De alguma forma, também é assim com as flores dos romances.

Sabendo que um dia acaba, aprendemos - também nem sempre de forma fácil ou consciente - que só temos o hoje com tudo que amamos. Hoje para admirar a beleza e sentir o perfume. Hoje para demonstrar carinho. Hoje para sorrir com as coisas simples e se encantar de novo pelo que conhecemos. Porque amanhã nosso objeto de amor toma outro caminho, o vaso se rompe ou por algum motivo chega a hora de dar tchau.

Eu já rompi mais laços do que gostaria. E sei que isso é só o começo. Foi uma grande oportunidade ter dedicado tempo às flores que me encantaram. Por isso desejo que no momento de se despedir de algo amamos (no presente ou no passado), tenhamos a confiança de que vivemos ao máximo essa experiência tão humana. Com os altos e baixos, lágrimas, sorrisos, lições. Que o tempo não tire de nós a capacidade de curtir ser e viver as flores que existem em nós.

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