Porque o Morumbi não tem personalidade - sobre converter espaços em lugares


São Paulo, 14 de agosto de 2019

Disse isso uma vez para o mais novo morador do bairro. Bem, ele acabara de escolher o apê pro qual ia se mudar. E eu soltei um "eu não moraria nesse aqui, não tem personalidade". Mas afinal, porque parece que alguns lugares não tem uma marca de identidade?
Foi pensando em como quero reencontrá-lo que entendi. O Morumbi (assim como outras bairros elitizados) não é um lugar de vínculos. E não venha me dizer que o casamento das pessoas com o trabalho é vínculo. Essa é uma relação que a maioria quer romper.
Bairros com vínculos são esses em que o espaço vira lugar. (Lugar, por definição, pressupõe a existência de sentimento, afeto). Onde as pessoas constroem suas vidas. Onde existem infâncias. Onde existe breja no domingo à tarde com os amigos do futebol. E churrasco. E sorvete. Não como aquela fuga na quarta feira de uma semana eterna, mas como o passeio com a avó no sábado tranquilo.
Foi pensando em como queria vê-lo, aquele ponto de luz que vai colore a arquitetura cinza quando estamos enamorados, que entendi como o Morumbi virou um lugar pra mim. E como cada espaço adquire personalidade cada vez que, num ato de resistência, as pessoas se gostam. De verdade. Não porque são colegas de trabalho ou por qualquer relação econômica envolvida. Mas quando elas esperam um mês pra se ver. Ou quando sabem de quais pontos dá pra ver a Lua melhor. Ou quando sabem onde colher flores e enfeitar a mesa do trabalho. Ou quando elas dão uma demonstração de afeto tão incomum no meio de tanta formalidade.
Assim, estou ansiosa para personalizar o Morumbi. E cada espaço por onde eu andar. Por onde f(l)or, que a gente possa converter mais espaços em lugares, deixar um pouco mais das nossas marcas e da gente mesmo. Mais vínculos, mais laços, mais cor. Assim quem sabe deixamos um mundo com mais cara de gente. E essa gente com mais personalidade.

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